A indústria agropecuária é ser uma das atividades com maior responsabilidade na contaminação do ar, solo e lençóis freáticos.
Quando aliada ao transporte de animais vivos por via marítima, esta fonte de poluição é incrementada desmesuradamente: se o transporte marítimo mundial fosse um país seria maior emissor de gases com efeito de estufa que qualquer país da UE e o 6º mais poluidora nível mundial, de acordo com as conclusões de um estudo publicado em junho de 2019 pela Federação Europeia para os Transportes e Ambiente (T&E). E, neste ranking, há que destacar que Portugal ocupa o 13.º lugar nas emissões provenientes da navegação ao nível da União Europeia.
As alterações climáticas, para as quais a indústria agro-pecuária em muito contribui, parecem ser as responsáveis pelo aumento de doenças outrora raras, como é o caso da doença de Mitchell ou Erythromelalgia (Liu et al, 2015), bem como pelo aumento de surtos de malária e outras doenças contagiosas, igualmente transmitidas por mosquitos, tal como referido na obra de Epstein & Ferber (2011). Este livro, escrito em co-autoria por um médico e especialista mundial em clima e saúde e por um jornalista científico premiado, explica os vínculos surpreendentes que existem entre o aquecimento global e a cólera, malária, doença de lyme, asma e outras patologias graves que ameaçam a saúde do ser humano.
Importa ainda mencionar que, independentemente do local onde os animais produzidos pela indústria agropecuária são abatidos e consumidos, estamos todos expostos às doenças causadas indirectamente pelo efeito estufa e pela contaminação dos solos e água.
O desembarque de animais doentes em quantidades massivas nos países importadores potencia riscos para a saúde pública dessa população. Acresce a esta situação a ausência de acompanhamento de um médico veterinário permanente o que, para além de ter implicações legais, aumenta o risco de propagação de doenças.
Já a nível local, os efeitos nocivos para a saúde humana da produção animal são acrescidos.
Em 2006 um surto de infecção nos EUA pela bactéria E. Coli ganhou proporções consideráveis. O surto ocorreu em setembro de 2006 e sua origem foi uma fazenda de gado Angus que arrendou terras a um produtor de espinafres. De uma só vez, foram infectadas 199 pessoas. Destas, 3 morreram e 31 sofreram de insuficiência renal depois de consumirem espinafres contaminados com E. coli O157: H7, uma bactéria potencialmente mortal causadora de diarreia sangrenta e desidratação. Veio a descobrir-se que a água de irrigação estava contaminada com fezes de gado de pastagem.
Também os trabalhadores da indústria agro-pecuária são particularmente afectados pelas zoonoses (doenças que passam dos animais para os humanos), sendo mais propensos a desenvolver doenças respiratórias, como asma e pneumonias conforme demonstram inúmeros estudos efetuados nas últimas décadas (e.g. Donham et al, 1989; Larsson et al, 1994; Hong et al, 2012), incluindo em Portugal (Viegas et al, 2012). Problemas lombares e depressões são frequentes neste eixo populacional (Jakobi et al 2015), que acabam por desencadear consequências na economia do país, que paga do bolso dos contribuintes as avultadas baixas médicas (Jakobi et al, 2015).
Estudos recentes mostram ainda que também as populações que residem perto dos grandes complexos agro-pecuários são mais propensas a contraírem doenças, nomeadamente por contágio de bactérias transmissíveis de animais para humanos (e.g. Nair et al, 2016; Schultz et al. 2019). Uma destas bactérias, Staphylococcus aureus, é particularmente perigosa, por ser resistente aos antibióticos.
Embora a maioria das zoonoses sejam contraídas pelo consumo de carne, também podem ser contraídas através do contacto com animais infectados, sendo depois transmitidas por contacto directo entre humanos, podendo, em última instancia, tornarem-se pandémicas.
Em suma, a criação e transporte de animais vivos é um negócio que beneficia alguns, mas que prejudica a saúde de todos, e é por isto que a PATAV só vai parar quando isto acabar.
Bibliografia
1 - Liu, T., Zhang, Y., Lin, H., Lv, X., Xiao, J., Zeng, W., ... & Ma, W. (2015). A large temperature fluctuation may trigger an epidemic erythromelalgia outbreak in China. Scientific reports, 5, 9525 2 - Epstein, P. R., & Ferber, D. (2011). Changing planet, changing health: how the climate crisis threatens our health and what we can do about it. Univ of California Press 3 - Donham, K., Haglind, P., Peterson, Y., Rylander, R., & Belin, L. (1989). Environmental and health studies of farm workers in Swedish swine confinement buildings. British journal of industrial medicine, 46(1), 31-37 4 - Larsson, K. A., Eklund, A. G., Hansson, L. O., Isaksson, B. M., & Malmberg, P. O. (1994). Swine dust causes intense airways inflammation in healthy subjects. American journal of respiratory and critical care medicine, 150(4), 973-977 5 - Hong, P. Y., Li, X., Yang, X., Shinkai, T., Zhang, Y., Wang, X., & Mackie, R. I. (2012). Monitoring airborne biotic contaminants in the indoor environment of pig and poultry confinement buildings. Environmental microbiology, 14(6), 1420-1431 6 - Viegas, S., Veiga, L., Malta-Vacas, J., Sabino, R., Figueredo, P., Almeida, A., ... & Carolino, E. (2012). Occupational exposure to aflatoxin (AFB1) in poultry production. Journal of Toxicology and Environmental Health, Part A, 75(22-23), 1330-1340 7- Jakobi, H. R., Barbosa-Branco, A., Bueno, L. F., Ferreira, R. D. G. M., & Camargo, L. M. A. (2015). Sick leave benefits for workers in the Brazilian meat and fish industries in 2008. Cadernos de Saúde Pública, 31(1), 194-207 8 - Nair, R., Wu, J., Carrel, M., O'Brien, A., Quick, M., Farina, S., ... & Smith, T. C. (2016). Prospective multicenter surveillance identifies Staphylococcus aureus infections caused by livestock-associated strains in an agricultural state. Diagnostic microbiology and infectious disease, 85(3), 360-366 9 - Schultz, A. A., Peppard, P., Gangnon, R. E., & Malecki, K. M. (2019). Residential proximity to concentrated animal feeding operations and allergic and respiratory disease. Environment international, 130, 104911